22 de junho de 2008

O TEMPO LEVA E DEIXA

Deixa a saudade e leva a existência.
No seu irrefragável curso, o tempo arrebatou, no dia 19.06.08, a Sr.ª D. Aldina Simões da Costa. Contudo a sua memória viverá no coração de todos aqueles que tiveram o privilégio de a conhecer.
A sua vida exemplar, de muitos conhecida e admirada, é digna dos maiores encómios: adorável esposa, dedicada mãe e, por excelência, uma grande amiga.
Tive o especial prazer de a conhecer e de com ela privar devido aos laços telúricos que me prendiam a Hilário Costa - grande e saudoso amigo.
Da sua vida nos Estados Unidos pouco sei. No entanto, recordo com saudade o frutuoso tempo que com D. Aldina e o marido convivi, aquando da sua viagem à Venezuela para angariar fundos para a compra do Palacete de Bustos.
A sua passagem pelo tempo medido pelo relógio foi muito breve para os familiares e amigos. Uns e outros sabem que a sua ausência os deixa mais desamparados e sós.
Para prestar a minha sóbria e sentida homenagem à distinta bustoense - ontem como hoje digna do maior apreço - não encontrei melhores palavras que as da alocução que proferi na Venezuela com o intuito de laurear o casal Simões da Costa:
"Para si, D. Aldina, de quem chegámos a ter ciúme por pensarmos que nos iria roubar um amigo e um valor, pelo tardio matrimónio do amigo Hilário consigo, a minha grata homenagem.
O nosso ciúme foi puro egoísmo e, em contrapartida, ganhamos uma amiga, uma grande mulher de quem Bustos se pode orgulhar. As flores que lhe oferecemos, simboli­zam o amor, a paz, a felicidade, a coragem e a sua alegria de viver
"
A esposa do Sr. João Ferreira Casimiro entrega à Sra. D. Aldina da Costa um precioso ramo de flores. Satisfação em conviver.
D. Aldina tenha um eterno descanso.
Até sempre, a saudade da sua presença será eterna enquanto vivermos.

Ulisses Crespo, Cronista da Vila

19 de junho de 2008

ALDINA MOTA E GALA


27-09-1925 19-06- 2008

Faleceu hoje Aldina Mota e Gala, viúva de Hilário Simões da Costa. Contava 82 anos.

Após doença prolongada despede-se de nós uma mulher admirável, melhor dizendo uma Senhora.

O “NB” associa-se à dor de Milton e Hilário Costa, seus filhos, assim como dos restantes familiares. O funeral realiza-se no sábado, saindo às 19 horas da capela mortuária.

18 de junho de 2008

INSTITUTO DE PROMOÇÃO SOCIAL DE BUSTOS S.A

Em resposta a várias solicitações dos nossos leitores aqui fica a hiperligação para o portal do Ministério da Justiça onde poderão consultar o documento de constituição da nova Sociedade Anónima, Instituto de Promoção Social de Bustos (20 mil acções ao preço único de 5 Euros), cujo conselho de administração é constituído por Diógenes Nunes Vidal (presidente), Manuel Arlindo da Rocha Valente (vogal), Manuel Oliveira dos Reis Neves (vogal).

O conselho fiscal é integrado por Manuel Carvalheiro Dias (presidente), Mário João Ferreira da Silva Oliveira (vogal) e LCA - Leal, Carreira & Associados SROC (vogal).

16 de junho de 2008

MILTON COSTA E UM NOVO E.T.


Uma Nova Classe de Bactérias foi descoberta a 1447 metros de profundidade no Mar Vermelho e estudada por uma equipa de investigadores da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), coordenada pelo Prof. Catedrático Milton Costa, do Departamento de Bioquímica e pelo Doutor André Antunes, do Centro de Neurociências e Biologia Celular.

Esta descoberta é o resultado de uma investigação iniciada em 2004 com uma expedição ao Mar Vermelho organizada por investigadores alemães. Os cientistas portugueses e alemães pretendiam isolar microrganismos de zonas hipersalinas, sendo que foi a primeira vez que se recolheram organismos do fundo das fossas salgadas do Mar Vermelho, onde não há luz nem oxigénio.

Recorrendo a uma sonda, foram retiradas amostras da interface entre o solo e a salmoira da fossa abissal de Shaban, vários microrganismos foram posteriormente isolados na Alemanha com a colaboração (do Prof. Robert Huber e o seu grupo da Universidade de Regensburg). A caracterização destes microrganismos foi depois concluida em Coimbra.

Um dos micróbios descobertos – designado no laboratório por E.T. (o nome científico é, Haloplasma contractile) representa “um grupo de bactérias que nunca se imaginava que existisse, importantíssimo para o estudo da evolução das bactérias. É uma linhagem evolutiva diferente de todas as linhagens existentes” explica o docente da FCTUC que, sustenta, “em termos de microbiologia fundamental é o micróbio mais estranho e interessante descoberto nas últimas duas décadas, completamente diferente do que se conhecia no mundo”.

Esta descoberta, cujo artigo científico foi recentemente publicado no jornal de referência da Microbiologia, o Journal of Bacteriology, está a agitar a Comunidade Científica Mundial porque há um “mundo” a desbravar no novo grupo de microrganismos.

Sendo o ET um “micróbio do outro mundo é muito difícil percebê-lo e por isso há muitos estudos a realizar, estudos que passam p. ex., por sequenciar o genoma do micróbio, caracterizar o seu ambiente, entre muitos outros. Há já um investigador da Alemanha (do Instituto Max-Planck) a estudar a mobilidade do ET”, adianta o Prof. Milton Costa. A bactéria tem uma morfologia singular e parece mover-se por “tentáculos”.

Para se ter uma ideia da importância da descoberta desta Classe de bactérias (em termos evolutivos, uma Classe representa um grupo de organismos como os mamíferos, ou as aves ou os insectos), no reino das bactérias são conhecidos pouco mais de duas dezenas de filos/classes - com determinadas características evolutivas conhecidas. Este micróbio representa mais um destes grupos evolutivos mas com características muito diferentes dos outros.

Nota de imprensa da Faculdade de Ciências e Tecnologia
Universidade de Coimbra

15 de junho de 2008

A MARCHA INFANTIL DA ABC

O dia de ontem foi um sábado em cheio. Por um lado e levando à letra uma das medidas para combater a crise, capinei uma terra de pão que tinha ao abandono, assim a preparando para regressar aos tempos da auto-suficiência. Fazendo jus ao meu comentário ao texto do passado dia 6 sobre o tema “2008 – ano internacional da batata”, comecei a prevenir-me contra a fome que se avizinha. Só me falta trocar o tractor pelo burrico e recuperar as alfaias d’outrora.
Esperam-me lucros chorudos, que é desta que o Estado vai revolucionar a política agrícola (comum?) e passar a subsidiar os pequenos agricultores em vez dos latifundiários que encheram a bolsa a fazer de conta que produziam.
*

Mas outros eventos ímpares tiverem lugar este sábado:
Os Doze reuniram em mais um dum dos seus capítulos mensais; o 2º GP Frei Gil de carrinhos e barcos solares, organizado pelo IPSB, foi um sucesso nacional e a miudagem da nossa ABC marchou em grande estilo.

Por agora, é este último evento que vos quero relatar:
Ainda a luz do dia dava os últimos suspiros e já a malta do jardim de infância dava início às marchas populares. A cativante coreografia deu os primeiros passos no átrio da ABC, seguindo-se um curto cortejo até à igreja, logo regressado ao largo do costume, ali onde começa a rua do Xico e doutras celebridades locais.
Acreditem: foi um espectáculo de grande beleza, encanto e harmonia. A Direcção do ABC caprichou, o António Quinta Nova (o nosso António do Talho) continua o mesmo mestre de sempre a letrar e musicar as marchas e, desta vez, até uma prestável coreógrafa palhacense – Lúcia Moura – ajudou à festa. Um encanto para o muito público presente.
O tema deste ano girou em redor do sal e das salinas, proporcionando imagens muito originais e de rara beleza.

O nosso sal é diferente
Tem o sabor português
Pois à mão foi fabricado
E com ele está misturado
O suor de quem o fez

E as varinas ligeiras
Esguias, sempre com pressa
Não param de apregoar
O peixe vivo a saltar
Com a canastra à cabeça

O coro das marchas era composto pela esforçada Direcção e Funcionárias, com a ajudinha do grupo musical convidado – a Mini Banda dos Covões.
O esforço de todos, em especial do quadro das funcionárias (o Mário e o novo director técnico foram os únicos varões no meio de tantas saias…) reflectiu-se no resultado: foi um encanto ver a miudagem dançar ao ritmo da marcha e os aplausos finais foram o espelho desse agrado.

Este ranchinho alegre
De meninos e meninas
Vêm com satisfação
Em noite de S. João
Cantar o sal e as salinas
O refrão explica bem o porquê de tanta alegria:
No mundo inteiro
Não há prazer igual
Passear num moliceiro
Junto às marinhas de sal

Desde já proponho que o tema central das marchas do ano que vem seja sobre outras marinhas: as do arroz que nos matou a fome até inícios dos anos 60.
Afinal, temos de nos prevenir contra a escassez de cereais…

oscardebustos

12 de junho de 2008

IPSB - PASSADO E FUTURO

Vem-se assistindo nas últimas semanas a manifestações que se dividem entre a preocupação, o espanto e até a revolta. Tudo porque, inevitavelmente, se soube que foi constituída uma sociedade comercial anónima (SA) com o aparente objectivo de passar a dirigir os destinos do IPSB/Colégio Frei Gil. Então agora que os actos das sociedades passaram a estar disponíveis na internet, no chamado Portal da Justiça, era inevitável virmos a conhecer a parte visível do iceberg, digamos assim.
Apanhado de surpresa, o próprio corpo docente do Colégio sentiu essa estranheza e preocupação e não tardou a reunir com os dirigentes do IPSB. Pelo que pude perceber, os esclarecimentos acabaram por acentuar as dúvidas. Como também acabei por perceber, serão poucas as razões para tantas dúvidas e temores, pelo menos no futuro imediato. A ver se acerto na explicação:
Um pouco da muita história do IPSB
O Colégio que sempre conhecemos é propriedade de uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) de matriz religiosa, a designada “Sociedade de Promoção Social da Obra do Frei Gil”, ou Obra do Frei Gil e cuja sede se situa na Praia de Mira. A esta instituição, salvo erro, pertencem ainda 14 centros de acolhimento de crianças abandonadas e jovens em risco, espalhados por Mira, Gafanha, Ourém, Santa Maria da Feira, Porto e Cervães (Braga). O saudoso Frei Gil deixou obra de grande mérito, que chegou mesmo a Angola, onde um seu sobrinho (Frei Gil Filipe) dirige centros missionários. São de Frei Gil estas palavras: “Não matem as crianças. Dêem-mas”. Um encanto!
O IPSB de todos nós, pais, docentes, alunos, funcionários e cidadãos em geral, é outro encanto: nas suas instalações e equipamentos, na qualidade do seu ensino, na preocupação e empenho com que formam os homens e mulheres de amanhã. E no desporto, é bom não esquecer.
É sabido que o Ministério da Educação, através da DREC(*), reconhece tamanhos méritos e não tem regateado elogios e os apoios que são sabidos, de resto, justos e até vantajosos para um Estado que, se é certo que subsidia, também não é menos certo que ali não investiu.
Mas como também é do domínio público, o Estado prepara-se para deixar de subsidiar estabelecimentos de ensino particular que apresentam lucros, às vezes chorudos. O que bem se compreende, ainda por cima na presente conjuntura. Se bem se recordam, gritou-se ao morto quando tal política foi anunciada...
O IPSB e o futuro
Não estranho – antes palpito - que a sociedade comercial “IPSB – Instituto de Promoção Social de Bustos, S.A.” foi constituída em 2/11/2007 para responder à nova política governativa. Tudo continua sob o controle da Obra do Frei Gil (80% do capital social), cabendo o restante aos que há muito a dirigiam e tutelavam. Ou seja, tudo como dantes, embora a SA não tenha sido constituída em “circuito fechado”, de forma a restringir a transmissão de quotas a estranhos. Ou seja: quem livra a nova sociedade anónima dum qualquer xeque das Arábias ou rei da nova Rússia adquirir a maioria do seu capital social? O dinheiro compra tudo: Mourinhos, Cristianos Ronaldos, participações sociais…
É altura da pergunta vital: então e o IPSB enquanto estabelecimento de ensino? É que o IPSB é titular duma licença de funcionamento, do mesmo modo que é parte interessada num protocolo com a DREC. E diz-nos o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo não Superior que a licença de funcionamento não é transmissível por acto entre vivos. Irá a SA requerer uma nova licença para si e estabelecer um novo protocolo com o ME/DREC? Minha gente: se assim fosse, tal implicaria uma reavaliação de todo o processo de cooperação entre o IPSB, SA e o Ministério da Educação, coisa em que não acredito.
Mas porque sou um crente evolutivo e acredito piamente nas leis e nos emaranhados mecanismos do mercado capitalista (tendência neo-liberal), vou antes pela nova versão da conhecida parábola de Maomé:
Antes que Maomé vá à montanha, vamos nós descê-la ao encontro d’Ele, dizendo-Lhe:
- Mestre, já não precisas de subir a montanha. – Vês? (disse, apontando o dedo). A montanha já não existe, arrasámo-la! Assim, ó Chefe dos Crentes, escusas de subi-la.
*
Oscar Aires dos Santos, dito o oscardebustos
*
(*) Direcção Regional de Educação do Centro

FÓRUM DE BUSTOS 2008 - 27 JULHO

10 de junho de 2008

A Feira Medieval foi à Mamarrosa

Terão presente a edição de 2007 da tradicional Feira Medieval do concelho, que decorreu no recinto da feira do Sobreiro e que poderão recordar AQUI.
Terminando o périplo pelas 6 freguesias do concelho, a Feira assentou arraias no ampliado Parque do Rio Novo, ali à saída da Mamarrosa para a Amoreira. Já conhecia o espaço, onde por duas ou três vezes já tinha roído as unhas de inveja. Com a criação do bonito parque da Mamarrosa, Bustos passou a ser a única freguesia do concelho sem um parque de lazer. Estranho…ou nem por isso. E, já agora, de quem é a culpa?
Mas esqueçamos as amarguras do nosso viver e viajemos um pouco pela Feira concelhia deste ano. Mais um sucesso, a acrescentar ao do ano passado.
O cenário medieval repetiu-se a partir do fim da tarde de 6ª feira passada e terminou quando a noite de domingo se despedia. No sábado à tarde temeu-se o pior, tal a força de dois inimigos inclementes: o sol e o jogo Portugal-Turquia. Felizmente, tudo acabou em bem: no domingo, os toldos passaram a proteger as mesas de comes e bebes e Portugal tinha dado uma lição de futebol aos otomanos.
Ufa! Até o governo da República deve ter suspirado de alívio!
Lembro aqui duas das recriações históricas que mais terão marcado os muitos visitantes:
O assalto à ponte
Antecedendo o Tratado de Alcanizes, assinado em 1297 entre D. Dinis de Portugal e D. Fernando IV de Castela, terras havia que os castelhanos mantinham ocupadas e os portugueses reclamavam como suas. Foi um pouco dessa história que - mais uma vez - o VIV’ARTE trouxe até à bonita e bem enquadrada ponte de madeira que atravessa o pequeno lago do parque do Rio Novo. Nem de propósito, como passo a narrar:
Como os castelhanos daqueles idos cobrassem portagem a quem tinha de atravessar a ponte, o povo de cá revoltou-se com a injustiça estrangeira. Com o apoio real, dá-se o assalto à ponte com a populaça à frente. Decorrida uma curta mas difícil escaramuça a meio da ponte, que meteu aríete e tudo, lá derrotámos os odiados castelhanos, numa espécie de antevisão do que haveria de acontecer em 1385 com a batalha de Aljubarrota.

O povo rejubilou de contentamento, mas desconfio que foi o rei português quem acabou por colher os melhores dividendos. Ninguém me convence que a conquista da ponte tenha posto fim às malfadadas portagens; acredito mais que apenas tenha mudado a nacionalidade do portageiro…

Os Franciscanos na Palhaça
Esta recriação foi trazida pelo inestimável Adelino Batista, que todos conhecemos do Museu S. Pedro da Palhaça e que não se tem poupado em buscas documentais e orais sobre uma comunidade franciscana que existiu no Roque nos finais da idade média. Este lugar da Palhaça recebeu o seu nome de S. Roque, o santo padroeiro.
A comunidade franciscana expandiu-se para sul ao longo da então estrada real, criando núcleos na Mamarrosa, S. Lourenço do Bairro, Paredes do Bairro e outras, até Cantanhede. Com a reforma franciscana, cerca do ano de 1600, a comunidade concentrou-se em Aveiro.
Certo é que ainda nos finais do séc. XIX estava enraizado no Roque e em Nariz o espírito franciscano, a ponto dos fiéis fazerem questão de ser enterrados com o conhecido hábito franciscano. O Adelino Batista teve acesso a assentos de óbito que disso fazem fé. E não há muitos anos, a casa e a capela da comunidade existiam ainda.
Muito grato fico ao Adelino Batista pelos elementos que me facultou e mais gratos ficaríamos todos se o seu trabalho fosse ainda mais apoiado e valorizado.
E venham mais Feiras Medievais!
*
oscardebustos
*
- Aconselho uma visita on line ao Museu S. Pedro da Palhaça, cujo sítio encontram à esquerda, em “Ligações”.

6 de junho de 2008

2008 - O ANO INTERNACIONAL DA BATATA


A ONU declarou 2008 como o ano internacional da batata. Não lhe invejo a sorte – à batata: no Egipto, no Haiti, no Senegal ou no Bangladesh rebentaram motins populares contra o aumento dos preços dos bens alimentares e espera-se que o tubérculo seja a solução para a crise de fome mundial que se avoluma no horizonte.

De acordo com os dados e previsões do Banco Mundial, no final deste ano e por comparação com 2004, os preços do trigo e do arroz terão duplicado; açúcar, soja e o milho serão entre 56% e 79% mais caros. O impacto do aumento do custo dos bens alimentares é brutalmente regressivo, atingindo sobretudo os mais pobres, cuja despesa em bens alimentares representa uma proporção maior da despesa total. No Bangladesh, para comprar um pacote de 2kg de arroz já é necessário gastar o equivalente a metade do rendimento diário de uma família pobre. O presidente do Banco Mundial avisa que um aumento médio do custo dos bens alimentares de 20% poderá empurrar cerca de 100 milhões de pessoas para baixo da linha de pobreza absoluta de 1 dólar americano/dia.

Uma causa próxima da subida dos preços dos bens alimentares é o aumento dos preços dos combustíveis, que teve dois efeitos agravantes da crise de escassez. Por um lado aumentou os custos da produção agrícola; por outro criou as condições para uma irresponsável euforia política de subsídios ao biofuel, que motivou um desvio significativo de solos agrícolas para a produção de energia. Como era de esperar, ninguém admite o erro crasso, quanto mais propor a extinção dos subsídios agrícolas ao biofuel.

Mas a tendência de subida dos preços dos bens alimentares antecedeu em muito a euforia do biofuel e é sobretudo o resultado do forte crescimento da procura com origem nas economias emergentes. As reservas cerealíferas mundiais estão num mínimo histórico e só medidas estruturais capazes de aumentar a oferta poderão resolver o desequilíbrio. Para isso é imperativo terminar com o condicionamento político dos mercados agrícolas, a enorme rede de subsídios, proibições, quotas burocráticas e proteccionismo que na UE e nos EUA sustenta os rendimentos artificialmente elevados dos agricultores e desincentiva a produção agrícola que poderia satisfazer o dramático excesso de procura global.

Também não há boas notícias em termos da evolução previsível do preço do petróleo, que permanecerá a níveis extremamente elevados. A procura continuará a crescer, dos actuais 87 milhões de barris/dia para cerca de 99 milhões de barris/dia em 2015. Seria de esperar que a oferta aumentasse, reagindo ao estímulo gerado pelos preços elevados. Mas isso é pouco provável. A produção de países como o México e a Rússia está em declínio, em grande parte por causa da obsolescência tecnológica resultante da nacionalização dos recursos, que expropriou e desencorajou o investimento das petrolíferas internacionais em novas tecnologias. A Arábia Saudita pretende estabilizar a produção em torno do patamar dos 12,5 milhões de barris/dia nos próximos anos. A generalidade dos países da OPEP seguirão esta orientação.

Embora pareça paradoxal, aumentar a produção de petróleo nas circunstâncias actuais seria irracional. O petróleo é um recurso esgotável e isso significa que a opção de não extracção pode ser um investimento rentável, desde que o preço futuro esperado seja superior ao preço corrente. Para os países produtores e exportadores de petróleo onde a indústria petrolífera é estatal há basicamente duas opções: investir parte das receitas de exportação em aplicações de capital, ou “investir” na não extracção, diferindo as receitas para o futuro. Estes países têm feito as duas coisas: em 2006 os “petrodólares” passaram a ser a principal origem de fluxos globais de capital, ultrapassando os países asiáticos pela primeira vez desde os anos 70. Mas algumas das possíveis aplicações destes fundos estão-lhes vedadas: os EUA já deixaram claro que não permitirão que as principais corporações americanas sejam adquiridas por fundos soberanos asiáticos ou de países exportadores de petróleo. Limitada a aplicação em activos, o investimento através do diferimento da extracção torna-se uma opção racional.

Entretanto, para 100 milhões de seres humanos o futuro é uma promessa de fome. Com uma localização difusa, não produzem facilmente as imagens de miséria indefesa e cheia de moscas, ao gosto da piedade pós-religiosa. Ao contrário dos tibetanos, também não se encaixam facilmente na categoria cénica do “oprimido histórico” cuja defesa confere uma falsa sensação de pureza moral. Resta-lhes esperar pelo que vier. Não têm pão? Comam batatas, o brioche do séc. XXI.

Fernando Gabriel, Doutorando do Instituto de Estudos Políticos

In Diário Económico

4 de junho de 2008

POR UM SACO DE BATATAS (A FICÇÃO)

(Passando dos factos de uma notícia de jornal para a ficção. Ficção?)



Apressava-se o fim de tarde. Era domingo. Um homem de existência anónima e baixa condição social rodava despreocupadamente instalado em cima do seu motociclo. Ia de regresso a casa quando, à saída da Palhaça, inesperadamente um guarda da GNR o mandou parar.

O gesto autoritário do GNR surpreendeu de tal forma o quase sexagenário condutor do veiculo de ruas rodas, que uma travagem, tão aflita quanto trapalhona, evitou o atropelamento do distinto militar que ainda se afastou, temendo pelo desastre.

– Desculpe ó senhor guarda…sabe não estou habituado a estas surpresasentão o que deseja? – Perguntou o homem que suava no esforço de manter o motociclo direito. E em . A máquina parecia querer fugir-lhe das mãos.

O guarda, um homem novo, olhou o motociclista, uma figura caricata com um capacete laranja a abanar em cima da cabeça, e fez cara séria. Ao invés sorria o cidadão, incapaz de perceber o que se avizinhava, essa desgraça. E quanto mais exibia o riso nervoso, mais espalhava um intenso odor a tintol.

– Encoste a motorizada. Vai fazer o teste de álcool! – Ordenou o militar, devidamente acolitado.

Mas um teste para quê se eu confesso tudo! – Declarou o homem numa inequívoca demonstração de inocência. Não era pessoa para mentir, nem via qualquer mal no convívio com os amigos. Um vinhito ao domingo, que é dia do Senhor, é coisa quase obrigatória, é mesmo uma necessidade, até na própria missa.

Desta feita o militar sorriu, mas logo endireitou o rosto implacável dizendo:

– Vai fazer o teste!

– Ó senhor guarda, o senhor não está a compreender… – Insistiu o atarantado motociclista no esforço inglório de explicar as variadas e boas razões que levam um cidadão, marcado por uma vida dura de trabalho no campo, a esfregar a alma com uma daquelas pomadas de uva que alguns, os mais especiais, ainda são capazes de fazer. O homem queria reivindicar o direito à sua bebedeira dominical, um direito inalienável, pessoal e intransmissível. Não tinha dinheiro nem cultura, não tinha carro nem carta de condução, mas tinha o suficiente para poder pagar uns copitos aos amigos. Tudo normal, portanto.

O militar não era da mesma opinião pelo que, a contra gosto, se viu obrigado a soprar no balão, coisa que lhe pareceu mais fácil do que tocar pífaro. Soprou com raiva, como força e com verdade. Não estava ali para enganar ninguém.

– O senhor acusa uma taxa de alcoolemia de 1,59 gramas. – Anunciou o militar, usando uma linguagem incompreensível. E foi preciso algum esforço policial para o homem compreender que estava metido numa grande alhada. Tão grande que não o deixavam voltar a conduzir a motorizada e prometiam levá-lo para o Posto, a fim de realizarem um novo teste, ou um contra teste ou qualquer coisa parecida. Foi que o motociclista, que tinha pressa de chegar a casa, deitou as mãos ao céu.

Vocês não me façam isso que eu devia estar em casa. A esta hora a minha patroa tem a ceia a sair da panela. Olhem que ela mata-me!

Mas aqueles guardas nem pareciam gente, tão direitos, tão sérios, tão educados e ainda por cima a falarem como se fossem doutores ou homens de leis. Bem argumentou, bem explicou que não tinha feito nada de mais. Não havia razão de ser tratado como um bandidoEle que não era homem de arranjar problemas a ninguém.

– A ninguém, está a ver ó senhor guarda! Deixe isso, estou tão perto de casa

Repetiu argumentos, mostrou no rosto um desespero tão verdadeiro quanto os calos que exibia nas mãos, invocou até os cabelos brancos, tudo sem sucesso. Os homens da GNR estavam determinados e enfiaram-no no carro, tal e qual se faz a um malfeitor. Era noite.

Foi no súbito aconchego do automóvel policial, naquela quase intimidade, ainda não tinham chegado ao Sobreiro, que o homem tentou resolver a coisa da melhor maneira para todas as partes. Ainda que no seu íntimo sentisse bem a humilhação e a injustiça.

– Ó senhor guarda não me faça mal que eu não fiz mal a ninguém. E por ter bebido uns canecos também não é por que dou prejuízo. Vá ! Pare o carro, deixe-me sair que eu dou a todos um saquinho de batatas, mas do que há de melhor! Batatas novas, plantadas e criadas por mim. Um mimo, pode crer que nãocoisa assim em Portugal inteiro. Portugal? Qual Portugal, qual quê!? Nem na China, quanto mais!

Aquele polícia era de uma geração que, provavelmente, gosta de batatas fritas e em pacote, porque lhe respondeu com desdém, quase em chacota. Não desistiu, acreditando que não seria aquele jovem guarda, tão longe de conhecer a importância da batata nova, a levar a melhor. Não gostava de batatas, masmas quem é que não gosta de dinheiro?!

Tossiu para fingir um disfarce e levou a mão ao bolso interior onde guardava o carcanhol. no fundo, ao canto, dobradas em quatro, tacteou as duas notas de 20 Euros, uns oito mil escudos em dinheiro antigo, e pegando em tal fortuna ofereceu-a ao guarda que com ele viajava no banco traseiro.

– Ó homem, você sabe o que está a fazer? – Perguntou o guarda engrossando a voz. E o homem respondeu com candura e com inocência:

– É para vocês beberem umas cervejinhas… Como não gostam de batatas

O motociclista que tinha pressa de chegar a casa foi detido e presente ao juiz no dia seguinte, levando no alforge dois delitos: Condução sob o efeito do álcool e tentativa de corrupção.

O motociclista que tinha pressa de chegar a casa deitou-se inocente e acordou criminoso. Às vezes basta juntar uma boa tarde de domingo com um saco de batatas para que a vida de um ser humano abane e se transforme. Às vezes há dias assim...tramados!

Belino Costa

POR UM SACO DE BATATAS ( A NOTÍCIA)

Um homem, de 59 anos, foi detido pela GNR de Oliveira do Bairro por tentativa de corrupção de dois militares.

De acordo com informações da GNR, o suspeito terá tentado subornar os dois elementos da patrulha com um saco de batatas e 40 euros.

Tudo aconteceu na noite de sexta para sábado, durante uma operação de fiscalização rodoviária, efectuada na zona da Palhaça, em Oliveira do Bairro.

O indivíduo, que conduzia um ciclomotor, foi mandado parar pelos militares da GNR tendo acusado uma taxa de alcoolemia de 1,59 g/l. Foi conduzido ao posto da GNR de Oliveira do Bairro para um novo teste.

Terá sido no percurso entre a Palhaça, onde decorria a operação, e o posto que se deu a tentativa de corrupção.

De acordo com informações da GNR de Anadia, numa primeira fase o homem ofereceu um saco de batatas aos dois militares. Como não os conseguiu demover, terá então acrescentado 40 euros ao dito saco de batatas.

Os dois elementos da patrulha, que seguiam no carro, terão avisado o homem para o facto de estar a ter uma conduta que não era correcta e para a possibilidade de ser detido. Alerta que não foi tido em conta.

Mais seis detidos

A insistência do condutor na tentativa de fazer com que os militares o soltassem acabou por resultar mesmo na sua detenção, não pelo crime de condução sob efeito do álcool, mas também pelo crime de tentativa de corrupção.

O homem vai ser presente, amanhã, ao juiz de instrução criminal do tribunal de Oliveira do Bairro, que determinará as respectivas medidas de coacção. Nesta mesma operação, a GNR deteve mais seis pessoas. Duas por falta de carta de condução e quatro por condução sob efeito do álcool.

Paula Rocha

In Jornal de Noticias